sexta-feira, 29 de julho de 2016

Surdez

Escuto passos dentro de mim
são passos daquele amor que saiu
nem ao menos olhou para trás

Escuto choro dentro de mim
são lágrimas doces, doloridas
não contidas, de um amor sem café

Escuto e não enxergo grito
gritos de um amor mudo, que tentou ver
mas por desafeto, descaminhou

Já não há nada mais dentro de mim
há silêncio, melodia dos desa(l)mados.

terça-feira, 26 de julho de 2016

Ser adulto

 Crescer é carregado de uma palavra: responsabilidade. E responsabilidade é a habilidade de ser responsável e o que é ser responsável? Levar coisas nas costas que não queremos, trabalhar com algo que não queremos. Crescer traz angústia. Ser adulto causa angústia. Não adianta igreja, não adianta dinheiro, seremos sempre crescidos e vazios.
 Como ser diferente? Sendo Peter Pan? Não. Mudamos quando crescemos, nos tornamos resilientes e principalmente ranzinzas. É inerente.
 Ser crescido é viver também de aparências, mesmo não querendo viver delas. Quem consegue vira artista, mas adulto e artista é mesmo para aqueles que não querem responsabilidade dizem os adultos frustrados por aí.
 Alguns decidem caminhar, outros andar de bicicleta, outros preferem continuar na caverna. Crescer era a palavra que não queria saber o que era, pois é triste. O que não é? O vento? A poesia? A canção? A harmonia? A dor? As perguntas? O que não é?
 Crescer causa medo. O medo é o futuro, porque passado já aconteceu e podemos contar as lamentações, mas aquele inesperado acontecer deixa o ser adulto amedrontado.
  Antes queria apenas poder atravessar a rua sem que meu pai ou minha mãe segurassem minha mão, hoje só queria poder escolher não atravessar, porém não posso, sou adulto e adultos andam sempre em frente e não chega a lugar nenhum.
    

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Vias

Café na xícara, no copo
alma nos corpos
dia aquecendo poesia
pessoas perambulando
entre as vias sem saída

amor pela culatra
céu ensolarado
noite enluarada
corações enlatados

quando acordar nesse novo dia
apague os olhos 
acenda poesia

quarta-feira, 20 de julho de 2016

Toca o peito

Toca o peito e prediz. Arritmia. Rítmica. É alguma modalidade olímpica? Não. Então não diz. Reflexiva a alma, copiosa a mente, desnecessária a vida. Toca o peito e diz. É infarto. Farto da louça suja, dos copos vazios de álcool, farto estou de ficar aqui. Parou. O coração? Não, era infarto de alma. Não se pode dizer muita coisa, porque tem que reviver. Como? Com um beijo ou um pedaço de barata. barata? Não. Eu escrevi batata. Toca o peito e condiz. Sociedade. Poder. Podre. Temer. Nunca. Nunca Temer, isso deve estar sempre fora! Toca o peito e aceita. O desamor? O desaguar? O desalmado? Não, o fim da garrafa de vinho que me fazia esquecer de mim.

domingo, 17 de julho de 2016

Sempre azedos

São duas vias.
Duas vidas.
Alguns verbetes.
Muitos significados.

São dois copos de água
ardente e sem sal
Sem gelo, sem limão
apenas azedos.

Olho da janela o que Deus diz
É eterno tudo aquilo que fiz
Mas preferi o revés das marés.
As inúmeras heresias.

Escolhas. Estão sempre na sacola.
Vários copos, várias águas,
várias luas,
sempre 
azedos

sexta-feira, 15 de julho de 2016

Cidade rafaélica

A cidade cala as almas
seus muros de concreto
seus rádios ligados
a alma em perfeito desafeto

os becos escuros
as ruas sem saída
os ambulantes sem vida

na cidade tudonada é permitido

O prefeito, o delegado
mendigo morrendo de frio
em plena madrugada

Cidade cruel, desumana 
será que concede aos seus moradores
segurança?

A poesia escapa dos cachimbos
acessos no meio da escuridão
na praça da Luz

Luz para todos é ilusão
o cachimbo que acende aqui
liga a alma na escuridão

Quadros, lagoas, cinemas
lançamento, livros, novelas
Imagina se a cidade fosse
tudo isso que se fala dela?

sábado, 9 de julho de 2016

Frioquentequentefrio

dentro é frio
lá fora é quente
dentro é quente
lá fora é frio
frioquentefrioquente
quentefrioquentefrio
cuidado ao por o casaco
cuidado ao tirá-lo
você pode esfriar ou esquentar
seu coração

quarta-feira, 6 de julho de 2016

Diário de uma insônia

Noite 
Insônia 
Vira
Remexe 
Exemer
Mexemer
Acorda
Já é dia? Não
Já é noite? Não 
Sonha
Acorda
Sem sol 
Noite 
Insônia 
Não acaba 

segunda-feira, 4 de julho de 2016

Encaixe

Grito, saio de mim
Nos seus cachos eu me encaixo

Todos estão condicionados,
É tudo quadrado, tudo triangular
Tudo angular
Menos você

Silencio, volto a mim
É em sua alma que me embaraço

Querem ser lisos, duas dimensões
Padronizados
Menos você

Grito, saio, silencio entro
É em tudo que é você

Que me adentro.

sábado, 2 de julho de 2016

Augusto, os anjos do eu

  Sobrevivo de pequenos instantes e de coisas pequenas, sobrevivo porque viver é difícil. Quando Drummond escutou o conselho para ser gauche na vida, não tinha noção de como as coisas são, ou, se tinha algum traço impressionista, ele o ignorou. 
  Pior que sobreviver, é (ou são) as perguntas tão paradoxas que ocorrem em nós. Calma, respirem e pensem, porque escrevo somente sobre mim, o eu, sobre essas coisas? Porque conhecer a nossa individualidade podemos reconhecer nós, por isso Augusto dos Anjos publicou apenas um livro e o intitulou "EU", não porque era arrogante, mas pelo simples fato de todos os versos, sentimentos íntimos e desejos intrínsecos de vida e morte eram dele. Augusto sobrevivia, e eu também. Antes falar de todos esses meus conflitos, que criar um personagem apenas para servir a minha vontade, isso é demoníaco, no mínimo fascista, maquiavélico.
  Mas o que não é? O infinito é a peça para descobrirmos que todos somos microcosmos. Ser é pior ainda do que reverberar. Reverberar é marcar e caso não marcamos, não somos seres, somos algo que chegou, deu saudade, mas foi. O foi é questão de dor, e dor é morrer pouco a pouco com a distância, desgasta corações, explode estrelas, faz com que notas musicais morram, eu disse, é um puro sentimento de poder, conclui-se maquiavélico. 
  Queria as vezes que todas essas coisas, todos os verbos e enunciações morressem no limite do limite do limite, onde os olhos não alcançam, porque eu teria que de novo brincar de sobreviver.

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Ônibusamante

Entrei, sentei, estendi os pés
liguei a música nos fones de ouvido
as luzes ainda estavam acesas 
as pessoas entravam, 
ao meu lado tinha vazio.

eis que se passaram alguns minutos
uma linda garota meio perdida
encontrou o número da poltrona
era ao meu lado

Assustei-me um pouco pois começamos a conversar
o ônibus partiu, e a fala permaneceu
as luzes se apagaram, porque era o último do dia
os olhos castanhos meus, que se encontravam com os olhos                                                                                {esverdeados dela
deram lugar ao escuro, confiávamos no som das palavras

a conversa chamou as mãos que se tocaram
a cabeça inclinou e se apoiou, as mão clamaram o pescoço
os lábios se encontraram timidamente.


Foi assim, um instante, de transeunte, para amante passageiro
no final, lá, após umas três horas, os lábios se encontraram                                                                                      {(novamente)

E o coração diz, agora não, melhor não, conheci você hoje e agora
concordei, afirmando, a vida é feita de instantes bem vividos.
O ônibus chegou ao seu destino final.