terça-feira, 20 de setembro de 2016

O protetor do Rio

    
É no silêncio que nascem as histórias. Foi no grande Rio, o querido São Francisco que todas as nossas terras nasceram, das lágrimas e dos lamentos de Iati somos filhos abençoados. Nunca diga que seu sofrimento ou de sua tribo é em nível igual de Iati. Ela nos presenteou com vida, mesmo em sua dor, e das lágrimas que hoje formam o Velho Chico, nasce esperança, vontade, amor, e alimento para os desconsolados e saudosos.
   Como o choro de Iati e o silêncio dos corpos, o Rio é vivo. Permeia, conquista, encanta os homens para sua glória e desgraça, eleva as almas dos afogados até as estrelas, todas as noites, enquanto a Mãe d'Água senta nas pedras para pentear seus longos cabelos.
    O Rio, entretanto, perdeu seu protetor há muito tempo. O Rio é amor, mas os brancos o maltratam e até mesmo se esquecem que é do Velho Chico que emana toda força vital.
   Num tempo de intempéries, Domingos e Camila perfaziam os passos de Iati e seu amado guerreiro. Atendendo aos desejos de sua tribo trouxeram à tona a essência do Grande Rio, nisto, a Mãe d'Água se agradava e os deuses do Céu e da Terra confiaram de novo no homem, de que pode ser bom.
    Em todos os seus passos, Camila e Domingos exaltavam a beleza do Rio, e cada dia mais a Mãe d'Água se apaixonava por eles.


Naqueles dias o Rio ficava mais vivo, mais forte, mais desejoso, suas águas ficavam de outra cor, os peixes abundavam e sempre quando a meia noite o Rio dormia, Mãe d'Água elevava seu canto que acalentava a alma dos ribeirinhos.
  Em certo dia, na calada de uma noite morna, a Mãe d'Água e todos os seres amigos do Rio escolheram Domingos para ser seu novo protetor, tamanha coragem, força, vontade, fé, que transmitiria ao Rio quando nele estava, além disso, Domingos, segundo os seres do Rio tinha respeito ao silêncio das lágrimas de Iati.
   Camila e Domingos numa tarde escolhida por Quaraci (a deusa do Sol) decidiram mergulhar no Velho Chico. Suas águas estavam calmas e havia riso e alegria. Mas, é neste dia, escolhido pelo Grande Sol e com a benção do Rio, que Domingos seria destinado. Num certo momento, as águas mais profundas do Rio o prenderam, Camila ficou desesperada e tentou de todas as formas tirar seu amigo que estava imobilizado. Domingos sentia medo, mas as águas que o prendiam tentavam acalmá-lo. Camila gritava, e o bom guerreiro então entendeu.
  O Rio o incorporou, puxou para ele e sua alma desprendeu de sua casca e era agora filho de Mãe d'Água, parte do Rio. O Velho Chico criado pelas lágrimas de Iati agora se completa com as lágrimas de Camila, ambas dolorosas e puras.
  Desde então Domingos protege o Velho Chico das pessoas que maltratam suas águas, seus afluentes e seus seres, derruba embarcações e afunda pescadores de mal coração. Domingos morreu para transcender sua bondade e agora é recompensado com a sina de proteger o Rio São Francisco.
      

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